A noite cai, a puta sai. As luzes acendem, o céu escurece, as ruas vão ficando desertas, as cabeças despertas. As meias até ao joelho, apertadas, tão apertadas que a carne parece querer soltar-se daquele espartilho, roçam no interior das pernas já descarnadas. Os saltos agitam-se sob um corpo esquelético, pálido, patético. A pressa de chegar a sitio nenhum, à esquina mais próxima. Aqueles olhos negros, escondidos sob uma máscara artificial exagerada e esborratada, o cabelo moreno solto na poeira da cidade, na imundice de mãos anónimas e desconhecidas.
Acende um cigarro, unhas vermelhas. Saia curta, top acentuado, estás à espera de te vender ao desbarato? Chega o comprador: à dúzia é mais barato? Vendes-te como um naco de carne. Vendes o teu corpo e afirmas que alma fica intacta. “Tenho de fazer sacrifícios para conseguir o que quero”, dizes tu. Sacrifícios? Alma intacta? Não acredito. Sei o que vejo, vejo um pobre corpo entregue ao vício, não do prazer mas do dinheiro fácil e rápido. Sacrifício? Talvez mas és tu que te colocas nessa penitência e não me venhas dizer que não tem qualquer consequência! Já não te consegues dar a alguém que realmente te queria a não ser que te dê 50€ em troca. Não entendo, não consigo perceber. A noite acaba, acordas com lembranças do pesadelo recente. Dizes que não tem consequências? E esse olha apático, morto? Não é consequência?
(não consigo, não quero, não vou entender... )
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